Yasunari Kawabata - A casa das Belas Adormecidas

Literatura japonesa
Yasunari Kawabata - A Casa das Belas Adormecidas - Editora Estação Liberdade - 128 páginas - Tradução direta do japonês de Meiko Shimon (lançamento original 1961).

Este pequeno romance é um dos grandes clássicos da literatura mundial no qual Yasunari Kawabata (1899-1972), prêmio Nobel de 1968, soube lidar com realismo e ao mesmo tempo extrema delicadeza, temas difíceis como a busca pela felicidade após a perda da juventude e polêmicos como a morte, perversão e sensualidade. Kawabata imaginou um estranho bordel onde homens de idade avançada podem passar as noites com jovens virgens, adormecidas sob o efeito controlado de narcóticos. Este livro inspirou outros autores a escrever sobre os sentimentos e a sexualidade na terceira idade como o colombiano Gabriel Garcia Marques em "Memória de minhas putas tristes" que aborda a impossível história de amor entre um ancião e uma jovem prostituta. Existe uma tendência nas sociedades do ocidente e oriente a ignorar e evitar o assunto do erotismo na idade da impotência, quando o desejo e a atividade sexual certamente ainda existem.

O protagonista Eguchi, de 67 anos, encontra-se em uma situação diferente dos visitantes tradicionais uma vez que sexualmente ainda mantém o domínio de seu corpo mas, no seu caso, a situação é talvez mais triste porque ele tem a noção de proximidade da decadência física e de que, portanto, não está muito longe da melancólica humilhação dos outros clientes daquela casa. De acordo com os procedimentos da Casa das Belas Adormecidas, os clientes podem tocar as jovens nuas, mas nunca concretizar a relação sexual, fato limitado até mesmo pela falta de vigor físico dos idosos. Outra norma fundamental é que o conhecimento sobre os nomes das jovens com que passaram a noite e seus históricos sejam totalmente inacessíveis aos clientes; obviamente as meninas não têm a mínima noção do que foi feito aos seus corpos enquanto permaneceram entorpecidas durante o tempo da visita. Isto fica claro logo no capítulo inicial do romance:
— Não faça nenhuma brincadeira de mau gosto, por favor. Não vá, por exemplo, enfiar o dedo na boca da menina adormecida — recomendara insistentemente a mulher da hospedaria ao velho Eguchi.

No andar superior só havia dois cômodos, uma sala de oito tatames onde Eguchi e a mulher conversavam e, ao lado, provavelmente um quarto de dormir. Até onde se podia perceber, no andar térreo, pouco espaçoso, também não havia quarto para hóspedes; assim, a casa não poderia ser chamada de hotel. Não havia nenhuma placa com letreiro anunciando uma hospedaria. Além do mais, os segredos daquela casa não permitiriam colocar tal anúncio. Não se ouvia ali nenhum ruído. Além da mulher que recebera o velho Eguchi no portão com cadeado e que continuava à sua frente a conversar, ele não vira nenhuma outra pessoa. Se ela era a proprietária ou uma empregada, Eguchi, que estava ali pela primeira vez, não podia precisar. De qualquer forma, seria mais sensato não fazer perguntas desnecessárias.
Eguchi se torna um frequentador assíduo da casa e, ao longo do tempo e das cinco noites compartilhadas com as diferentes jovens adormecidas, relembra passagens de sua vida amorosa de acordo com os estímulos e sensações despertadas que variam da inocência e cheiro de leite materno e bebê da primeira noite até os fortes apelos sedutores de outras belas adormecidas que induzem Eguchi ao desejo de quebrar as regras da casa, tanto no sentido de completar a relação sexual quanto de conhecer melhor as jovens e outros clientes da casa. Ao longo de suas experiências o nosso protagonista testemunhará de perto a ocorrência da morte, uma possibilidade sempre presente na Casa das Belas Adormecidas. 
Eguchi afrouxou o braço que apertava a garota com força, abraçou-a com carinho e ajeitou seus braços nus de modo que ela o enlaçasse. E ela o abraçou docilmente. O velho manteve-se nessa posição e permaneceu quieto. Fechou os olhos. Aquecido, sentia-se num deleite. Era quase um êxtase inconsciente. Parecia compreender o bem-estar e a felicidade sentidos pelos velhotes que frequentavam a casa. Ali eles não sentiriam apenas o pesar da velhice, sua fealdade e miséria, mas estariam se sentindo repletos de dádiva da vida jovem. Para um homem no extremo limite da sua velhice, não haveria um momento em que pudesse se esquecer por completo de si mesmo, a não ser quando envolvido por inteiro pelo corpo da jovem.
A literatura de Kawabata é importante porque incomoda e faz pensar quando desnuda através do erotismo não convencional, ou até mesmo pervertido, os medos universais do homem diante do final da vida e incerteza do futuro, não somos todos assim?

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